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quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Lenda de Estremoz

Lenda de Estremoz


O calor apertava. A sede torturava-os. O pó punha-lhes a boca gretada e a língua áspera. A mãe, o pai e a filha precisavam descansar.
De súbito apareceu uma sombra larga, acolhedora, como um oásis no deserto. Um tremoceiro. A criança olhou os pais. ‘E se ficássemos aqui?’. Na sua imaginação aquela sombra era o paraíso…

Na manha seguinte, surgiu uma visita inesperada, um velho forte e autoritário. ‘Sou o dono de tudo isto... Do tremoceiro, que plantei por minhas mãos... Fora daqui! Não vos quero ver mais nos meus domínios!’
Altivo, o homem que viera de longe retorquiu ‘Pois já que nos ameaçais...dir-vos-ei que só á força sairemos...’
Pouco tempo depois, o velho voltou com muitos homens armados. A família preparou-se para defender a sua morada. ‘Porque somos tao perseguidos? Não fizemos mal algum e todos nos odeiam!
Entretanto, indiferente ao perigo, a criança tinha atravessado por entre os homens e avançara ao encontro do chefe. ‘Sabei, senhor... que estive a pensar numa coisa! Em volta duma árvore tao bonita como aquele tremoceiro podia construir-se uma povoação também bonita e grande... capaz de causar inveja ás outras povoações... Sabei que o meu pai é um grande constructor e a minha mãe ajuda-o em tudo... Se o senhor quisesse, eles poderiam construir aqui uma cidade, dirigindo o trabalho dos seus homens…
O velho olhava-a espantado.‘Ora esta! Uma cataria como tu... com uma ideia tao grande!’ Ela sorriu,
ingenua. O olhar do velho ficou a perder-se no vasto horizonte.
O velho chefe procurou o marido e a mulher. ‘Venho em missão de paz e amizade! Sei que sois um grande
constructor...’
O homem interrompeu-o, perplexo.’O quê? Fui, sou e serei unicamente um fidalgo.’
‘Mas, a vossa filha disse-me..’
Houve um leve sorriso nas expressões
do casal. ‘A nossa filha tem uma imaginação prodigiosa e vós… acreditastes...’
‘Mal posso acreditar...’ Mas a voz do velho tinha um tom bonacheirão.
A pequena ladina segurou carinhosamente nas mãos do velho e falou devagar. ‘Eu não vos enganei. Reparai
no que vos disse: com o auxílio de todos, poderemos construir uma grande povoação á volta do tremoceiro...’
O velho voltou a sorrir.
Dentro em breve, o sonho da rapariga começou a transformar-se em realidade.
Um tempo depois, o velho voltou com a boa nova que o rei D. Afonso III acedeu a dar foral a aquela terra. ‘Temos de dar um nome a nossa terra’ Todos se voltaram para a rapariguita.
‘Bem... parece-me que o melhor é por-lhe um nome que lembre aquela árvore a que devemos tao boa
sombra... se deve chamar Estremoços!’




Marques, Gentil. (1962)

Lendas de Portugal. Lendas dos nomes das terras. Âncora editora.

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